domingo, 24 de maio de 2009

Mosaico Urbano


O despertador toca, hora de acordar se preparar para pegar o ônibus e em breve, fazer parte do mosaico multicolorido que é o centro de Belo Horizonte. Todos os dias, inúmeras pessoas caminham por suas ruas. Seguem para trabalhar ou vadiar, reclamar ou agradecer, ir às compras ou roubar, além de tantos outros pares imagináveis. O centro é um lugar de possibilidades, por lá se corta cabelo por 3 reais e escova por 2, vende-se ouro em camisas e se andar um pouco mais encontra "o mais barato".
E no meio de tantos, trabalhadores se reinventam. Algumas propagandas são anunciadas no grito, seja um orçamento gratuito com o dentista, a venda, troca ou desbloqueio do celular e até mesmo para tentar a sorte nos jogos da lotérica. Este último, geralmente, vendido por deficientes visuais bons de garganta. E nem ouse passá-los para trás porque eles identificam as notas com as mãos!
Também se divulga produtos ou comércios por meio de panfletos, sejam aqueles entregues por alguém que as pessoas nunca dão atenção, ou do tipo adesivos, pregados em muros, postes e lixeiras. Um deles garante que traz o amor em 3 dias e um outro, para quem já encontrou o príncipe encantado, faz amarração para não deixá-lo escapar. Tudo isso acompanhado da palavra infalível e 100% garantido!
A maioria desses papéis e tantos outros descartáveis irão parar no chão, efeito da má educação do povo. Mais trabalhos para os garis que tentam deixar a cidade limpa. Certa vez o gari Antônio, encontrou no centro uma carteira com R$ 700 no dia do natal. Disse que comprou peru e outras coisas para a ceia, além de presentes para sua segunda mulher e seu filho. Depois enviou os documentos pelo correio para o dono da carteira.
Neste ponto da cidade as imagens padronizadas de sucesso e beleza, perdem lugar para as cenas do cotidiano verdadeiro, composta por gente que corre atrás, transpira e esperam em pontos de ônibus. Na avenida Paraná e nas proximidades da rodoviária, é possível sentir cheiro, som e imagem de América Latina. As cores e as arquiteturas dos estabelecimentos se confrontam, as lojas penduram seus produtos nas paredes externas, e sempre há um segurança na calçada para intimidar os ladrões de plantão.
Praça Sete é palco! No seu chão foram encenadas peças de teatro, desfiles de moda, apresentações de bandas, loopings sobre rodinhas e inícios de muitas manifestações. Quando ela é fechada para a gravação de algum comercial que impeça passagem, seus transeuntes se irritam, passam por dentre da faixa zebrada, xingam palavrões, e reclamam “pro pobre que é bom, não se faz nada!”.
No alto, ao redor da praça, imperam as sedes bancárias, local de trabalho de executivos que andam amarrados em gravatas, enquanto lá embaixo, no chão, os desprestigiados passam o dia sentindo conforto em combinações que a moda não aprovaria, punks em seus rasgados ou as aposentadas em suas sandalinhas macias e vestidos estampados com botões.
Na Praça Sete, opção não falta para distrair seres curiosos, se tiver sorte é possível presenciar um evento de porte internacional. Como os índios colombianos, vestidos com fantasias que mais remetem aos índios da América do Norte. Vêm acompanhados de caixas de som, microfones e cantam uma canção nada inteligível em língua nativa. Quando sentem a necessidade de ir ao banheiro, “os cara pintada”, se deslocam até o Mc Donalds. E o preço que se paga para vê-los, fica a seu critério. Bondosos não?
Este lugar de tantos, guarda algumas armadilhas. Quando é dia de pagamento de benefício as aposentadas se preparam para receber. Ao saírem do banco, são enganadas por mulheres que usam do nome de Deus para roubar a cristã. No centro as mulheres andam agarradas com as bolsas, e se os empregados de lojas de departamento se distraírem, podem perder até uma TV de 42 polegadas sob a luz do dia em local movimentado.
Mas tem a sua sedução. A rodoviária é uma ilha rodeada por casas de prostituição para garantir o prazer dos que chegam na capital ou dos belo-horizontinos que precisam de companhia. Dentro desses prostíbulos a quantidade de homens lembra um formigueiro, e eles podem escolher da mulher mais decadente a travesti mais exótica. Nessas casas uma prostituta pode atender até 40 homens em um dia de trabalho. E a satisfação é comprovada nas atitudes dos freqüentadores que às vezes descem as escadas "trocando as pernas".
No centro se assusta com facilidade, vez ou outra passa um senhor com um saco de linhagem e um pau de madeira na mão, de repente ele bate com força no saco e sai da sua boca um miado de gato escandaloso. Há também o fiel desesperado que sai correndo com uma bíblia aberta e gritando para que procurem a salvação.
Começa a escurecer e o trânsito daqui a pouco ficara caótico. Buzinas serão ativadas como brigas nervosas que envolvam palavrões. Os moradores de rua vão procurar um lugar confortável para deitarem. E logo as ruas se silenciarão, até que o despertador nos avise que mais um dia começa.

1 milhões de comentários:

Natália Oliveira disse...

Eu até comcei a ver o centro com outros olhos depois do seu texto. :)